Todo mundo sabe arrastar e soltar arquivos no Finder. É rápido, simples, parece infalível. Mas o que quase ninguém percebe é que esse gesto inocente pode custar horas de filmagem, projetos inteiros ou memórias insubstituíveis. O Finder mostra a barrinha de progresso, mas não garante que cada bit chegou inteiro ao destino.
Imagine copiar um cartão cheio de material bruto. A barra de progresso chega ao fim, mas silenciosamente alguns arquivos se corrompem. Ou, no meio de um vídeo enorme, o computador trava por excesso de carga — e o Finder não sabe retomar do ponto exato onde parou. O resultado? Perda de dados que só será percebida quando já for tarde.
É por isso que Gerentes de Mídia Audiovisual (GMA) e Técnicos de Imagem Digital (TID) não confiam em operações manuais de cópia. Eles recorrem a ferramentas que oferecem:
- Verificação rigorosa de cada bit copiado;
- Capacidade de retomar cópias interrompidas;
- Confirmação criptográfica da integridade dos dados;
- Registro detalhado de todo o processo.
Por que precisamos de verificação (checksums)
No mundo digital, basta a falha de um único bit para comprometer um arquivo. Por isso, copiar dados não é apenas transferir: é garantir que cada 0 e 1 chegue exatamente igual ao original.
É aqui que entra o checksum. Ele funciona como a impressão digital do arquivo. Assim como duas pessoas nunca têm a mesma digital, é praticamente impossível que dois arquivos diferentes tenham o mesmo checksum. Se um único bit mudar, a impressão digital muda completamente — e você descobre o erro na hora.
Existem várias formas de verificar a cópia:
- Tamanho do arquivo: o método mais simples — e o menos confiável. É como pesar duas caixas: podem ter o mesmo peso, mas conteúdos totalmente diferentes.
- MD5: algoritmo clássico, amplamente aceito no audiovisual. Mais lento, mas sólido.
- xxHash: a nova geração. Extremamente rápido e confiável para uso em backups profissionais.
O checksum é o divisor entre cópia confiável e desastre silencioso. No set de filmagem, em um laboratório ou no computador de casa, é ele que confirma que o arquivo copiado é idêntico ao original — sem margem para dúvida.
Usando rsync
para backup
Entre as ferramentas profissionais de backup, o rsync se destaca como um clássico. Está disponível nativamente no macOS e Linux, e é usado há décadas por administradores de sistemas, cientistas de dados e profissionais do audiovisual. Permite cópias incrementais, checagem de integridade e criação de logs detalhados — tudo o que um fluxo profissional exige.
https://learn.microsoft.com/pt-br/windows/wsl/install
Para quem não tem familiaridade com o Terminal, vamos passo a passo. Primeiro, precisamos identificar os drives conectados:
ls /Volumes
O comando ls
lista o conteúdo de um diretório. Nesse caso, mostra todos os drives montados no sistema. A saída será algo como:
Cada disco terá um nome diferente. Basta identificar qual é a origem (ex. CARTAO_CAMERA
) e qual é o destino (ex. HD_BACKUP
). Em seguida, podemos iniciar a cópia com:
rsync -r /Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
Esse é o comando mais básico. Ele copia todo o conteúdo do drive de origem para o de destino. Repare na barra /
ao final: ela significa "copie o conteúdo", e não a pasta em si. Se a pasta de destino não existir, o rsync a cria automaticamente.
Depois de rodar, é só abrir o Finder e conferir: os arquivos do cartão já estarão no disco de backup.
Parâmetros e bandeiras
Apesar da utilidade desse primeiro comando, ele ainda não atende os requisitos de um backup profissional. Para isso, existem algumas outras bandeiras que devemos utilizar. Vamos começar uma que auxiliará nossa rápida compreensão do estágio da cópia: a barra de progresso.
rsync -r --info=progress2 /Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
Perceba que, além de mantermos todos os parâmetros anteriores, adicionamos ainda a bandeira --info=progress2
. Durante a cópia, veremos informações úteis como:
O próximo passo é garantir que todas as informações dos arquivos sejam preservadas durante o backup. Isso vai muito além de copiar apenas o conteúdo: é fundamental manter datas de criação e modificação, permissões de acesso, links simbólicos, estrutura de pastas e até atributos especiais dos arquivos. Essas informações são essenciais porque registram quem modificou os arquivos, quando e de que forma, garantindo não só a segurança do arquivo naquele momento, mas também criando um histórico confiável que permite revisões e auditorias futuras.
A bandeira -a
(modo de arquivamento) do rsync é essencial para isso: ela funciona como um pacote de segurança que instrui o programa a preservar todos esses detalhes automaticamente. Sem ela, você pode até copiar os arquivos, mas perder informações críticas — por exemplo, a data original de um vídeo, permissões de execução de scripts, ou links simbólicos que fazem parte do funcionamento de um projeto. Ademais, ela serve como um substituto da bandeira -r
(cópia recursiva), pois já preserva a estrutura de pastas e arquivos.
Para garantir que todas as informações dos arquivos sejam preservadas durante o backup, podemos utilizar o código abaixo:
rsync -a --info=progress2 /Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
Com a bandeira -a
, o rsync preservará todas as informações dos arquivos, como podemos ver na saída abaixo:
Ainda dentro dessa mesma linha de raciocínio, devemos notar que não basta que o backup seja feito corretamente: é preciso documentar todo o processo. Logs são o instrumento que utilizaremos para provar que o trabalho foi feito corretamente.
Para gerar logs detalhados da operação, adicionamos mais algumas flags ao nosso comando:
rsync -a --info=progress2,stats
--log-file="BACKUP_CARTAO_01.txt"
--human-readable
/Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
Vamos entender cada uma dessas flags adicionais:
--log-file="BACKUP_CARTAO_01.txt"
especifica um arquivo onde o rsync vai salvar todos os logs da operação. Isso é muito útil para documentação e para resolver problemas caso algo dê errado;--human-readable
faz com que os números (tamanhos de arquivo, velocidades de transferência etc.) sejam exibidos em um formato mais fácil de ler, usando unidades como KB, MB, GB em vez de bytes;
Na prática, este comando vai criar um arquivo de texto contendo as datas e horas de cada operação, a lista completa de arquivos processados, as estatísticas de transferência (velocidade, tamanho total) e eventuais erros ou avisos durante o processo. Se algo der errado no futuro, seus logs serão a primeira fonte de informação para entender o que aconteceu.
Verificação com checksums
Uma vez estabelecidos os parâmetros básicos, precisamos, finalmente, implementar a verificação por checksums - bit por bit. Como vimos, é essa verificação que nos dá a certeza absoluta de que cada arquivo foi copiado com perfeição, funcionando como uma impressão digital única para cada arquivo.
O rsync nos oferece duas opções principais de algoritmos para essa verificação:
- MD5: esse algoritmo foi, durante muito tempo, o padrão da indústria audiovisual. Por isso, apesar de ser mais lento, é universalmente aceito e compatível com praticamente todas as ferramentas de verificação.
- xxHash: a nova geração de verificação. Oferece a mesma segurança do MD5, mas com performance significativamente superior. Por isso, é a opção recomendada para backups profissionais.
Para habilitar a verificação por checksums no rsync, precisamos adicionar duas flags importantes:
rsync -a
--info=progress2,stats
--log-file="BACKUP_CARTAO_01.txt"
--checksum
--checksum-choice=MD5
/Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
O que cada flag adiciona ao processo:
--checksum
: ativa a verificação completa do conteúdo de cada arquivo, garantindo que cada bit foi copiado corretamente;--checksum-choice
: permite escolher entre MD5 (padrão da indústria) ou xxHash (mais rápido) para a verificação;
Embora o MD5 seja amplamente reconhecido e aceito como padrão industrial, existem situações onde a velocidade de processamento se torna mais crítica que a universalidade do algoritmo. É nesse contexto que o xxHash64 emerge como uma alternativa valiosa.
Quando lidamos com volumes de dados extremamente grandes — como projetos cinematográficos de longa-metragem ou séries com múltiplas câmeras — o xxHash64 oferece uma vantagem significativa de velocidade, sendo consideravelmente mais rápido que o MD5. Embora seja menos universal em termos de aceitação industrial, sua implementação é simples e eficaz.
Para utilizar o xxHash64, basta substituir o parâmetro no comando:
rsync -a --info=progress2,stats --log-file="BACKUP_CARTAO_01.txt" --checksum --checksum-choice=xxh64 /Volumes/CARTAO_CAMERA/ /Volumes/HD_BACKUP/
Com a verificação por checksums habilitada, o rsync nos fornece informações adicionais sobre a integridade dos dados:
Conferência de relatórios
Após a conclusão de todos os backups, é essencial realizar uma verificação completa para garantir que a integridade dos dados foi mantida. Esta etapa de validação é tão importante quanto o próprio processo de cópia, pois confirma que cada bit foi transferido corretamente.
O primeiro passo é examinar o arquivo de log gerado durante o processo. Abra o BACKUP_CARTAO_01.txt
para verificar as seguintes informações críticas:
- O número total de arquivos copiados, que deve corresponder exatamente ao número de arquivos originais.
- O tempo total de transferência, que permite avaliar a eficiência do processo e planejar futuras operações.
- A taxa de transferência média, que indica se houve gargalos durante a operação.
Para uma verificação adicional de integridade, você pode validar arquivos específicos utilizando os seguintes comandos:
xxhsum -H1 /Volumes/HD1/Projeto_X/Cartao01/arquivo.mov
Ao executar este comando em ambos os arquivos (original e cópia), podemos comparar os hashes:
Como podemos ver na demonstração acima, quando os hashes são idênticos, temos a garantia criptográfica de que os arquivos são exatamente iguais, confirmando a integridade dos dados transferidos.
Procedimento, não improviso
Backup profissional não é improviso: é checklist. É protocolo. É disciplina. Assim como um piloto segue cada item antes de decolar, um fluxo de backup segue etapas definidas e testadas.
A força do rsync + checksums + logs está justamente no que eles têm de mais simples: transformar cópia de arquivos em um procedimento verificável e confiável. Esse padrão é válido tanto para grandes produções audiovisuais quanto para os seus arquivos pessoais.
Não existe backup sem verificação. Não existe verificação sem logs. Não existe confiabilidade sem procedimento. Trate seus dados como se fossem um negativo original. Porque, de certa forma, eles são.